MPF e MPPA recomendam que Redd+ do PA respeite direitos socioclimáticos e não beneficie grandes proprietários

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Arte: Comunicação/MPF | Recomendação foi enviada à Semas na sexta-feira (6).

O Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) emitiram, na sexta-feira (6), recomendação conjunta à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Pará (Semas) para a adoção de providências que possam garantir transparência, consulta prévia e demais medidas de efetivação de direitos socioambientais e climáticos no contexto do Projeto de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal, Manejo Sustentável e Aumento do Estoque de Carbono (Redd+) Jurisdicional no Estado do Pará.

Procuradores da República e promotores de Justiça indicam, por exemplo, a necessidade de que o percentual da repartição de benefícios no eixo “produção agrícola sustentável” destinado a grandes proprietários rurais seja redistribuído entre a agricultura familiar e os povos e comunidades tradicionais, devido à total incoerência da participação dos maiores causadores das mudanças climáticas na repartição de benefícios desse sistema.

Os membros do Ministério Público apontam que foi equivocado o anúncio veiculado pela agência de notícias do Estado, que noticiou suposta venda de R$ 1 bilhão em créditos de carbono. Na verdade, segundo o MPF e o MPPA, não houve venda, e sim uma sinalização de interesse, uma promessa de venda de créditos de carbono, que serão gerados por meio de um projeto ainda a ser construído, já que a venda está condicionada ao cumprimento de uma série de requisitos que ainda não foram atingidos.

Convenção 169 precisa ser cumprida – Além disso, o MPF e o MPPA criticam a falta da realização da consulta prévia, livre e informada a povos e comunidades tradicionais. Segundo a recomendação, as oficinas informativas realizadas até o momento não podem ser consideradas como algum tipo de etapa da consulta ou “pré-consulta”. A consulta deve ser realizada de forma livre, prévia e informada, em conformidade com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), frisa o MP.

O MP argumenta que o modelo bifásico adotado para as oficinas – com uma fase informativa já realizada e uma fase consultiva prevista para o futuro – não foi devidamente explicado às comunidades. A primeira fase, que consistiu em oficinas informativas organizadas por três organizações sociais (Coordenação Estadual das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo – Malungu, Federação dos Povos Indígenas do Pará – Fepipa, e Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS), foi compreendida pelas comunidades como meramente explicativa, sem que tivessem a oportunidade de expressar seu consentimento ou discordância em relação ao projeto.

Além disso, MPF e MPPA apontam que a consulta prévia tem se limitado à questão da repartição de benefícios, sem abordar outros aspectos cruciais do projeto, como o sistema de monitoramento e a verificação da contabilidade de carbono. A recomendação exige que a consulta abranja toda a estrutura do projeto, garantindo que as comunidades tenham acesso a todas as informações relevantes para a tomada de decisão. O MP também critica a restrição da participação na consulta a apenas três organizações, reforçando a necessidade de ampliar o diálogo para incluir todos os povos e comunidades tradicionais potencialmente afetados pelo projeto.

Não a benefícios para causadores de mudanças climáticas – Em relação à proposta da Semas de que, no eixo do projeto de Redd+ Jurisdicional denominado “produção agrícola sustentável”, o pequeno produtor receba o mesmo percentual que os médios e grandes proprietários de terra do Estado do Pará, o MP alerta que “é incoerente e foge ao objetivo do regime jurídico de direito público e da tutela coletiva [proteção jurídica de direitos que pertencem a grupos, comunidades ou à sociedade] que o Estado equipare o tratamento de grupos historicamente discriminados e vulnerabilizados aos grandes proprietários de terra”.

Considerando que a lógica da geração de crédito de carbono é o pagamento por resultado na contribuição contínua para redução de emissões, e que estudos apontam que o maior percentual de emissões do Brasil vem do agronegócio, pela mudança do uso do solo, não se justifica o recebimento de pagamento por resultado a esse segmento – grandes produtores do Estado –, que já possui disponíveis para si outros mecanismos de financiamento, aponta o MP.

“Ademais, a maior quantidade dos processos em que o Ministério Público é parte está relacionada a conflitos de terra envolvendo grandes proprietários, que possuem histórico de grilagem, desmatamento, invasão de territórios tradicionais, Cadastros Ambientais Rurais inválidos sobrepostos, cadeia produtiva altamente poluente, uso de agrotóxicos e pecuária extensiva, uso de trabalho escravo, e outras violações de direitos humanos”, salienta o MP.

Riscos de grilagem e desrespeito à autonomia – O MP também expressa preocupação com o risco de “grilagem de carbono”, ou seja, a geração de créditos de carbono em áreas públicas sem a devida autorização e sem o cumprimento das medidas de proteção de direitos socioambientais, as chamadas salvaguardas. Para evitar esse tipo de irregularidade, a recomendação exige a criação de um Sistema Estadual de Registros de Projetos, que monitore os projetos de carbono em andamento no Pará e impeça a dupla contagem de créditos.

Outro ponto polêmico levantado pela recomendação é a inclusão de áreas federais, como terras indígenas e Unidades de Conservação, no cálculo das reduções de emissões do Redd+ Jurisdicional. Embora a Semas argumente que essa inclusão é necessária para evitar a dupla contagem de emissões, o MPF e o MPPA questionam a legalidade dessa medida, que contraria a Lei 11.284/2006, a qual vincula a titularidade dos créditos de carbono ao domínio da terra. A inclusão de áreas federais no projeto também levanta sérias dúvidas sobre o respeito à autonomia e aos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais que ocupam esses territórios.

Detalhes das medidas recomendadas – O MPF e o MPPA recomendaram à Semas que:

  • emita, em dez dias úteis, nota informativa corretiva para informar claramente à sociedade que não ocorreu venda de crédito de carbono, mas mera assinatura de um “Contrato de Compras de Reduções de Emissões” firmado entre a Companhia de Ativos Ambientais e Participações do Estado do Pará e a Emergent Forest Finance Accelerator Inc. que prevê a possibilidade futura de negociação de expectativas de créditos de carbono;
  • adote providências para assegurar a transparência ao processo de construção e comunicação, possibilitando ao público a compreensão do real conteúdo do contrato assinado, para que se entenda que não se trata de venda de créditos de carbono, em dez dias úteis;
  • adote providências para a disponibilização integral da documentação remetida ao Ministério Público em todos os meios de acesso à informação ambiental à disposição da Semas – como sites, correios eletrônicos, bibliotecas, dentre outros –, em especial a disponibilização da arquitetura integral do projeto do Redd+ Jurisdicional e o projeto de plano de consulta apresentado como proposta para tentativa de futura pactuação, em dez dias úteis;
  • realize audiências públicas, consultas públicas, reuniões públicas, respeitando-se a diversidade de regiões do Estado, as quais devem ser divulgadas amplamente e com antecedência necessária, encaminhando-se informações prévias que sejam capazes de subsidiar as discussões e tomadas de decisões, para que os diversos setores da sociedade possam compreender o projeto, debater e contribuir com críticas e sugestões, em 30 dias úteis;
  • realize a Consulta Livre, Prévia e Informada assegurada pela Convenção 169 da OIT, respeitando-se os protocolos autônomos em vigor, e também os procedimentos culturalmente diferenciados para a tomada de decisão, tudo em conformidade com a Convenção 169 da OIT, comprovando a adoção de medidas em 30 dias úteis;
  • realize busca ativa de todos os povos e comunidades tradicionais do Estado do Pará, que não são representados pelas organizações sociais mencionadas pelo Governo do Estado ao MP, de modo que se assegure a ampla participação culturalmente diferenciada, comprovando a adoção de medidas em 30 dias úteis;
  • seja registrada, dentro do projeto, a não aceitação por parte de qualquer comunidade e organizações representativas, com suas respectivas justificativas, bem como que se viabilize que a área de seus territórios seja subtraída do projeto, possibilitando a opção de participar ou não no cálculo de carbono desde o início dos trâmites;
  • que o percentual de 7% do eixo dois da proposta de repartição de benefícios, destinado a médios e grandes proprietários rurais, seja redistribuído entre a agricultura familiar e os povos e comunidades tradicionais, em razão da total incoerência da participação dos maiores causadores das mudanças climáticas na repartição de benefícios desse sistema, comprovando a adoção de medidas em 30 dias úteis;
  • seja construído um Sistema Estadual de Registros de Projetos, o qual deve realizar um levantamento robusto dos projetos privados verificados e em processo de verificação (em todas as certificadoras que estão em operação), bem como dos projetos privados existentes em áreas públicas sem anuência do órgão gestor e sem cumprimento de salvaguardas (conhecido como grilagem de carbono), para que o abatimento de créditos proposto seja realizado de forma íntegra e com a participação dos órgão de controle, comprovando a adoção de medidas em 30 dias úteis.

Íntegra da recomendação

Fonte: PRPA-ASCOM Assessoria de Comunicação MPF-PA e Publicado Por: https://www.adeciopiran.com.br em 09/12/2024/15:05:38
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