(Foto: Reprodução) – A decisão, tomada durante os primeiros dias de seu mandato, vem repercutindo no Brasil e no mundo entre especialistas, que alertam para suas consequências devastadoras.
O presidente norte-americano Donald Trump ordenou a interrupção do fornecimento de medicamentos essenciais para o tratamento de HIV, malária e tuberculose, além de suprimentos de saúde para recém-nascidos em países beneficiados pela USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional).
A decisão, tomada durante os primeiros dias de seu mandato, vem repercutindo no Brasil e no mundo entre especialistas, que alertam para suas consequências devastadoras.
Em entrevista à Reuters, fontes ligadas à USAID disseram que as empresas terceirizadas e organizações parceiras receberam memorandos que determinam a suspensão imediata do trabalho. Entre elas está a Chemonics, uma das principais consultorias contratadas para gerenciar o fornecimento de medicamentos em diversos países.
A ordem atinge diretamente programas de combate a HIV, malária e tuberculose, bem como iniciativas voltadas à distribuição de contraceptivos e suprimentos de saúde materno-infantil. Segundo reportagem da Reuters, a suspensão impede até mesmo que medicamentos em estoque sejam entregues a clínicas financiadas pelos EUA.
O congelamento de 90 dias na assistência ao desenvolvimento foi decretado no primeiro dia de mandato de Trump, em 20 de janeiro, sob justificativa de revisar a eficiência dos programas e sua consistência com a política externa dos EUA.
Contudo, ativistas apontam que a ação ameaça um histórico de compromissos bilionários dos EUA como maior doador individual de ajuda humanitária no mundo.
Em 2023, os Estados Unidos desembolsaram US$ 72 bilhões em assistência, representando 42% de toda a ajuda humanitária monitorada pela ONU no ano seguinte.
Repercussão no Brasil
Em entrevista à Agência Aids, especialistas e ativistas brasileiros reagiram com preocupação à medida.
Pedro Chequer, médico e ex-diretor do Programa Nacional de Aids
“Esta, entre tantas outras, é uma decisão que impacta de imediato na vida das pessoas que vivem com o HIV e poderá reverter todo avanço que observamos desde o estabelecimento do PEPFAR (Plano de Emergência do Presidente dos Estados Unidos para a Luta contra a Aids). Esta iniciativa, estabelecida em 2003, tem sido um dos principais pilares do tratamento e dos cuidados contra o HIV, globalmente. Estima-se que o programa tenha evitado a morte precoce de quase 30 milhões de pessoas e que muitos países, principalmente do sub-Saara africano, dependam desse aporte para disponibilizarem o tratamento na rede.
O PEPFAR não se limitou apenas à provisão de medicamentos; apoiou países no estabelecimento de redes de diagnóstico, além de outros exames laboratoriais para seguimento dos pacientes e avaliação da resposta terapêutica. No entanto, sua agenda inicial extremamente conservadora e fundamentalista na prevenção trouxe danos nesse campo. Ainda assim, o impacto positivo do tratamento adequado compensou essa adversidade, com queda na ocorrência de novas infecções, expressiva redução da mortalidade e melhora na qualidade de vida dos pacientes. Como tantas outras medidas adotadas pelo presidente Trump, essa é mais uma decisão lamentável que esperamos ser revista diante do imenso impacto adverso na vida de milhões de pacientes.”
Alessandra Nilo, coordenadora geral da ONG Gestos Soropositividade, Comunicação e Gênero
“O que aconteceu com as medidas do governo Trump já era esperado. O que torna a situação mais difícil é que, neste momento, não há uma força de oposição suficiente nos EUA. As organizações da sociedade civil fazem um apelo aos cidadãos americanos para que protestem e também pedem que outros países contribuam com os programas de saúde global. Essa crise reforça a vulnerabilidade do modelo de cooperação internacional baseado em doações voluntárias. Precisamos rever essa estrutura e buscar formas mais sustentáveis de financiamento para evitar essa dependência. Esse é um momento crítico para discutir taxas sobre transações financeiras e fortalecer fundos globais.”
Fabiana Oliveira, do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas
“A decisão de Trump é assustadora e sem sentido, pois sem tratamento adequado, a Aids expandirá e levará milhares de pessoas à morte. Desde a criação do PEPFAR, milhões de vidas foram salvas e infecções evitadas. Cortar esses investimentos de forma abrupta é uma catástrofe. É urgente restaurar a linha de financiamento, e os movimentos sociais já estão se mobilizando para reverter essa decisão cruel. Há vidas em jogo, inclusive as nossas.”
Américo Nunes Neto, presidente do Instituto Vida Nova
“Essa atitude fere os direitos humanos e o acesso universal ao tratamento antirretroviral. Trump já ataca migrantes e refugiados e agora afeta as pessoas com HIV/Aids. Isso representa um retrocesso perigoso, gerando risco de vida. O governo brasileiro, organizações e agências internacionais precisam se posicionar com urgência.”
Veriano Terto Jr., vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids
“A suspensão do PEPFAR por 90 dias é extremamente preocupante, pois afeta milhões de pessoas que dependem desses medicamentos. São cerca de 20 milhões de beneficiados no mundo, muitos deles em países africanos. Mulheres grávidas, crianças e pacientes com câncer cervical também serão impactados. Além das graves consequências para a saúde, essa decisão gera pânico e instabilidade social. Não sabemos como ou se esses programas serão retomados, mas precisamos nos mobilizar contra essa atitude irresponsável e criminosa.”
Rodrigo Pinheiro, presidente do Fórum de ONGs/Aids de São Paulo
“Acompanhamos com preocupação os cortes na ajuda financeira dos EUA à OMS e a programas de saúde, principalmente os relacionados ao HIV. No Brasil, já há mobilização e estamos discutindo como nos posicionar. Precisamos mostrar ao governo americano que esses cortes impactam também a sua própria população e economia. Vamos buscar apoio e articulação com outros movimentos.”
Márcia Leão, do Fórum de ONGs/Aids do Rio Grande do Sul
“As medidas de Trump são apavorantes. Além da suspensão de remédios e atendimento, há cortes de recursos que afetam a resposta global à saúde. Essa retirada de financiamento ameaça não só a aids, mas também outras doenças. Não sabemos como será o cenário após os 90 dias, mas é fundamental que os movimentos sociais se mobilizem contra essa decisão.”
Salvador Correa, ativista, escritor e psicólogo
“O congelamento de recursos da PEPFAR é um golpe na ajuda humanitária global e coloca milhões de vidas em risco. A resposta ao HIV já vinha sofrendo com a redução de financiamento internacional, mas esse corte abrupto agrava a crise. É desumano e criminoso deixar pessoas sem assistência. Precisamos ampliar o acesso aos recursos para garantir tratamento e prevenção a todos.”
Marta McBritton, presidente do Instituto Cultural Barong
“Assistimos à implementação de uma política higienista e excludente que condena pessoas vivendo com HIV ao esquecimento. Essa indiferença é um crime contra a humanidade. É urgente uma mobilização internacional para reverter esse cenário. O Brasil, que já foi referência no enfrentamento ao HIV/aids, precisa retomar esse protagonismo.”
Fabi Mesquita Guarani, coordenadora de Comunicação do Instituto Multiverso
“A decisão de suspender o fornecimento de medicamentos representa um retrocesso devastador na luta contra epidemias e ameaça 25 milhões de vidas. Além do impacto na saúde, a suspensão favorece o surgimento de cepas resistentes a medicamentos. A comunidade internacional deve agir rapidamente para reverter essa catástrofe e garantir o direito à saúde para todos.”
Eduardo Barbosa, coordenador do MOPAIDS (Movimento Paulistano de Luta Contra a Aids)
“Estamos sob a ameaça de um conservadorismo que ignora evidências científicas na luta contra o HIV. Além dos cortes, há um retrocesso moralista. O mundo não pode continuar dependente dos recursos americanos. Precisamos buscar alternativas globais para garantir a continuidade desses programas essenciais.”
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